Amar no Escrever

Olhar o mínino, apanhá-lo, exacerbá-lo e racionalizá-lo. Do pensamento para o papel directa e seguramente. As minhas mais inúteis e valiosas premissas.

Tuesday, August 29, 2006

Amar com pêsames.

E pronto. Uma ideia pouco vulgar e felizmente pouco comum mas, ainda assim, uma geral comichão sentimental e intelectual.
Não sei como estar. Já fumei, comi, ouvi, falei, fiquei e andei sem que nada mudasse. Generalizo obviamente levado a crer que todos nos sentimos assim quando amamos com pêsames. Perdi tanto tempo neste debruço que sinceramente mais vale escrever por escrever. Se poupar umas horinhas de matutanço a alguém já valeu a pena.
Estamos portanto perante um problema. O nosso amor perdeu alguém que nos diz, no mínimo, menos. Ficamos portanto incapazes de limpar a sua tristeza e de viver com ela mas, ainda assim, encarregues de apoiar da melhor maneira possível. Nem a total concentração no desempenho de tal tarefa nos tira a azia.
Sendo vincado nalguns aspectos, tenho o traço de esquecer instintivamente o que me magoa mal sinto quem amo magoado. Basicamente foi isso que fiz. Ainda não tive tempo para sufocar com a sua tristeza sentindo, porém, sempre presente, a tal comichão. Quando ela acalmar terei tempo para me debruçar aqui e deixar-me sofrer já com a noção que o pior passou e sempre com mais algum descanso. Também não a quero sufocar com atenção. Saber dar espaço é a primeira regra de ouro após uma morte.
No meu caso particular amo alguém forte e decidido, capaz de reagir a adversidades como ninguém.. Acreditem; isto não ajuda nada! Mais valia um pranto infantil muito mais fácil de acalmar que um estado de vigília constante por cima de um véu negro e pesado. Conformo-me pensando que também com isto me apaixonei. Com esta força desgarrada.
Então mas afinal a que palavras recorri? A que conclusão cheguei? Longe do génio pretendido, acabei por apenas preparar três episódios: o velório, o funeral e a lembrança espontânea. Nunca mas nunca entrar pelos clichés do costume... "Ai já estava tão doente", "ai viveu uma vida cheia", "ai foi para um sítio melhor". Quem diz isto que passe já um atestado de trissomia vinte e um ou que se limite, por opção sua e consequentemente a bem, aos palpites Floribelanos do dia-a-dia. Preparei-a para estas frases que, sendo escarretas cerebrais, vêm ainda por cima de gente que não conhecia o falecido ou com quem o falecido tinha a relação do "bom dia!". Depois preparei-a também para o choro pegado. Dois querem verdadeiramente chorar mas dá-se rapidamente o acidente em cadeia e na percepção desse choque sai magoado quem, verdadeiramente, precisa de lágrimas. Nunca esquecer o embate que sofre quem nos ama ao ver-nos chorar evitando portanto aqueles choros induzidos por nós. Se se amava o falecido então porquê faltar-lhe ao respeito e lembrá-lo por algo que todos têm? Velórios e funerais.. Porquê amá-lo em vida, perdê-lo para a morte e depois recordá-lo morto? Aqui chego à lembrança espontânea. Que se chore pelo pormenor. Pelas meiguices e felicidades sublinhadas em momentos únicos agora irrepetíveis.
Assim marquei a minha posição e apresentei-lhe a tristeza real imunizando o pranto social. Infelizmente não posso estar lá para ver mas sinto-me mais calmo e confiante em alguém que merece, hoje e sempre, o máximo do meu crédito.

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